sexta-feira, 20 de abril de 2012



Nem acho que a palavra do criador seja tão importante para entender sua obra, mas morri de amores agora vendo o que a Björk falou sobre o "all is full of love". É bem o que eu prego sobre a música, inclusive a inspiração na natureza:

"I guess waking up after having been in Spain for six months in the mountains...with few people. It was kind of solitary. And it was April, and I had to walk in the morning...around the mountains. And spring just kicked in. It was definitely nature-inspired."

"That song's from a moment when I'd had a pretty rough winter and then it was a spring morning and I walked outside and the birds were singing: Spring is here! I wrote the song and recorded in half a day. It just clicked - you know: you're being too stubborn, don't be so silly, there is love everywhere. The feeling, the emotion of the song was like completely melting and loving everything and feeling like everything loved you, after a long time of not having that. The song, in essence, is actually about believing in love. Love isn't just about two persons, it's everywhere around you."

terça-feira, 3 de abril de 2012

Faces do amor-cosmos segundo Björk


Até onde sei (posso estar errado, obviamente), Björk representa um caso único na música pop. Não que o tema seja novidade para a pintura, poesia, filosofia e cinema, mas, em sua área, a cantora parece se engajar sozinha num difícil e essencial esforço: abrir possibilidades de expandir a experiência humana. Mesmo não vendo isso pejorativamente, há uma muito sedimentada associação na cultura popular da música como instrumento de expressão – seja pessoal ou coletiva (canções de amor, protesto, religiosas, etc).
Poderíamos nos perguntar: mas como seria possível atingir algo além do humano? E para que? O poeta Francis Ponge construiu toda a sua poesia em cima deste questionamento. Sua obra se volta para aquilo que não é humano, mas, no entanto, nos cerca: flores, insetos, a água, etc. Aprendemos com a poesia de Ponge, no entanto, que uma total saída do humano seria uma ilusão, mas aproximações são possíveis. O humilde esforço de alguém consciente de suas limitações significa alcançar o que é estranho ao nosso entendimento e, não apenas conhecê-lo, mas apreender diferentes maneiras de ver o mundo e mesmo de viver.  A dimensão estética se torna assim uma atividade de conhecimento e  ética.
Chegar perto da natureza e atividade dos cristais. Assim se coloca a proposta de Björk em Crystilline. 
A música possui dois pólos nitidamente contrastantes: algo como uma serenidade inicial, estranhamente finalizada na violência energética de uma batida drum n' bass. Há algo que explique este momento inicial – significa a abertura ao mundo, o que requer humildade e um olhar sereno para as coisas. Assim, o que vemos de início é a atitude de alguém atento às manifestações da natureza:

Underneath our feet
Crystals grow like plants
Listen how they grow

Esta atitude de abertura ao mundo está explicitada desde All is Full of Love, em que a cantora encontra um amor cósmico vibrando em todas as coisas. Há algo em Crystilline, no entanto, que dá um passo além deste contato com o mundo. A artista quer não apenas ser afetada por esta energia, como alcançá-la em seu fluxo. To reach love - este verso da composição desvenda o seu movimento.
Deste modo, à escuta atenta às vibrações da natureza se contrapõe o desejo de torná-las palpáveis. É aí que entra a atividade do artista-músico, papel assumido por Björk: captar a energia pulsante dos cristais, materializar sua mudez em sons. 
Mas por que o caminho para isto insiste em “conquer claustrophobia”? Porque a tentação de um antropomorfismo deve ser superado. Um ser humano pode sentir um incômodo ao imaginar algo ativo nas entranhas da terra. No entanto, para o cristal, este é o seu campo de atividade, o seu habitat.
A força de tal empenho finaliza-se no maravilhoso verso final, em que vemos justificada o contraste com o restante da peça:

It's the sparkle you become
When you conquer anxiety

Há uma violência pulsante na conclusão, pois o que Björk encontra não é apenas a beleza dos cristais, mas o seu núcleo, essência ou verdade. A composição, iniciada por um espectador frente a estes minerais - "listen how they grow" -, termina como que do outro lado, operando a recriação deste som. Atingir o coração da atividade dos cristais significa não apenas possuir dele uma experiência estética, mas, em certa medida, transmutar-se nele por um instante, englobar em nossa dimensão humana sua energia criadora. It's a sparkle you become